terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Apesar de 2012, para além de 2013


O fim do ano é o momento mais propício para se olhar para o tempo passado, se pensar nos momentos vividos até aqui, avaliar um por um, e, então, planejar os próximos passos, com mais confiança e esperança nos acertos vindouros.
Apesar de tantas violações aos Direitos Humanos em 2012, os processos de fortalecimento das lutas, integração das identidades e publicização das conquistas aconteceram. Marcaram a vida de muitos brasileiros e ficarão na memória de todos que andam aos passos da mudança.
Para exercitar nossa memória, citarei alguns acontecimentos marcantes aqui na Paraíba. Acontecimentos que, apesar de dolorosos, organizaram pessoas para a reconstrução de um novo ano, sem os mesmos desafios; pessoas prontas para impedir que novas injustiças semelhantes aconteçam e fazer valer toda a caminhada de 2012, para além de 2013.
Temos o caso de Enver José - processado injustamente pelos empresários de ônibus da capital-, perseguição política notória por ter liderado centenas de estudantes em passeatas, pacíficas, contra o abuso de poder e excessivo aumento das passagens de ônibus sem a contraprestação de melhores serviços. Hoje, depois de ter várias audiências remarcadas, percorrendo o ano inteiro nessa angústia, Enver foi absolvido.
Os índios Tabajaras continuam cercados pela empresa Elizabeth. No início deste ano, foi relatado ao Ministério Público Federal casos de violência privada, sob o comando da empresa, a qual ameaçou, por meio de força física e psicológica, os índios a se retirarem de suas próprias terras. Os índios continuam na mesma situação de insegurança.
A chamada reurbanização do Bairro São José não aconteceu. Os moradores do bairro conseguiram barrar o projeto inicial, colocado de cima pra baixo, sem diálogo, sem construção com eles - os principais envolvidos. O projeto ameaçava a destruição de algumas casas, a remoção de algumas famílias, a troca de uma casa de grandes dimensões por outra de tamanho padrão e muito menor.
Um caso de repercussão nacional foi o estupro coletivo de 05 mulheres na cidade de Queimadas, no interior da Paraíba. Foi um crime planejado com antecedência, numa cidade em que não é raro as mulheres sofrerem tanta violência. As audiências de julgamento já aconteceram, a reparação para as famílias das vítimas nunca se concretizará. No último dia 04 de Dezembro, mulheres do Campo e da Cidade reuniram-se no centro da nossa capital, em memória das mulheres que sofreram violência e em luta por políticas públicas que concretizem a proteção à vítima.
Por último, relembro o despejo de mais de 40 famílias da favela do Gadanha, próxima à bica, que estavam em seus barracos num terreno abandonado e foram despejados pela força policial, sob o comando da prefeitura municipal. Mulheres e crianças de colo, jovens e adultos foram atirados novamente à rua. Hoje vivem sob outra ameaça de despejo, moram numa escola abandonada no centro da cidade, nenhuma política de reparação é oferecida, apenas chegam ameaças.
O tempo por si é pedagógico, por isso é importante olhar para todos esses acontecimentos do ano. Aprendemos com as experiências passadas e por isso realizaremos novas conquistas.
E em memória de tantas pessoas sofredoras deste 2012, é que devemos planejar o nosso 2013. Não nos contentaremos com a fé de que as coisas serão resolvidas logo, mas sim com o compromisso de estar ao lado dos que lutam, com eles dividindo os próximos passos, no objetivo comum de um próspero ano novo.

Liziane Correia é estudante de Direito da UFPB e do Núcleo de Extensão Popular Flor de Mandacaru

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Passe Livre: quando a esmola é grande, o Santo desconfia!



Passe Livre: quando a esmola é grande,
o Santo desconfia!

Valendo o segundo turno para a Prefeitura de João Pessoa, os elegíveis têm propostas distintas sobre o transporte urbano. No entanto, nenhuma dessas propostas é uma grande novidade, nem tampouco rompe com o modelo que beneficia, em regra, a própria empresa que recebeu a concessão pública para o transporte aqui na cidade. Vamos lembrar o velho ditado: quando a esmola é grande, o santo desconfia! Nós pessoenses também estamos desconfiados. Estão duvidando da nossa inteligência?
Apesar de não tão expressivo nestes últimos anos, o movimento estudantil da nossa cidade conseguiu encampar algumas lutas por nossos direitos, os quais não são respeitados mesmo quando na letra da lei. Um exemplo gritante é a recarga do Passe “legal”, que, por registro em nosso Diário Oficial, em lei do deputado Gervásio Maia, qualquer estudante secundarista, graduando ou pós-graduando, que tenha documento que declare a sua matrícula\vínculo a estabelecimento de ensino, juntamente a um documento com foto poderá realizar qualquer benefício ou serviço semelhante aquele que a carteira de identificação estudantil permite. Ou seja: “pagar meia” em qualquer evento cultural, ser identificado enquanto estudante e recarregar o seu “Passe Legal”. Mesmo com essa iniciativa aprovada, estudantes estão passando vergonha quando tentam recarregar seus cartões com declarações e documentos com foto. Nenhum posto de recarga da AETC-JP permite a recarga. Desconhecem ou negam os direitos do estudante? Nesses momentos somem prefeitos, PROCON e deputados. O estudante paga o pato, ou melhor: paga inteira!
Quanto aos candidatos, nos parece que o custo benefício para qualquer uma das propostas é a própria limitação do direito à cidade. As propostas parecem gangorras! Enquanto uma permite a ida à escola, não garante que a passagem não aumentará para os outros usuários. A outra, enquanto garante que os trabalhadores e as trabalhadoras pagarão uma única taxa mensal, permite que os mesmos estarão presos ao único sistema de transporte urbano de João Pessoa, não garantindo o aumento da frota e não discutindo melhores condições de trabalho para o motorista e para o cobrador. Nenhuma propõe o equilíbrio entre custo e benefício para nós usuários. Muito menos citam que as empresas respeitarão as normas a que estão submetidas para melhor atenderem aos seus principais usuários consumidores.
Um pouco antes do segundo turno, temos a data 26 de Outubro para recordar. Ela é considerada o dia Nacional de Luta pelo Passe Livre, registrada pela primeira vez em 2005, com manifestação em 14 cidades do Brasil. Foi também nesta data que registrou-se a votação de uma lei de iniciativa popular que contou com 20.000 assinaturas na Câmara de Vereadores de Florianópolis (SC), pelo Passe Livre.
Mais um exemplo que apenas a pressão popular (expressões como movimentos contra o aumento da passagem ou dos ciclistas que questionam o projeto de mobilidade urbana) será capaz de fazer a Administração do município deixar de conceder os nossos direitos aos empresários do transporte. Com a luta, quem sabe o transporte público terá menos características de produto privado e passará a parecer cada vez mais uma política pública – como já deveria ser. A cidade só pode ser de quem se movimenta livremente por ela! Enquanto existirem catracas, eles brincarão com os nossos direitos, sempre em cima das gangorras.

Liziane Correia – é estudante de Direito da UFPB e do Núcleo de Extensão Popular – Flor de Mandacaru (NEP)

terça-feira, 21 de agosto de 2012

As greves e o trabalho de Sísifo


As greves e o trabalho de Sísifo

O Governo, numa espécie de tortura psicológica coletiva, empurra as possibilidades de negociação com os professores das Instituições Federais de Ensino Superior (IFES) contra a parede do prazo do ano orçamentário. Quanto mais próximos do fim de Agosto, mais os estudantes e a sociedade civil ficam irritados: ora com o Governo, ora com os Docentes. Trata-se de uma mistura confusa de indignação com o descaso com a Educação Superior somada à desinformação (ou desinteresse) da mídia que nos confunde a partir de porcentagens, gráficos, falsas negociações etc.
Falar em Greves significa conversarmos sobre categorias de trabalhadoras e trabalhadores que se preocupam com, em primeiro plano, a desvalorização de sua profissão do ponto de vista salarial, seguida de uma desvalorização da importância de sua carreira dentro de um contexto social e econômico. Lembrem: falamos de Educação Superior e de Instituições Públicas.
A reação não poderia ser outra: temos 52 IFES (de 57) com docentes em Greve. Fora outras 18 categorias de trabalhadores em Greve. Enquanto isso, o Brasil, separa largas fatias de seu orçamento federal para investir em grandes reformas para a Copa do Mundo e Olímpiadas. Pasmem: só com a cidade de São Paulo serão gastos 6,2 bilhões de reais em reformas. Em contrapartida o Governo oferece o gasto de 4,2 bilhões de reais com os 70.000 Professores brasileiros.
Durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, início do período neoliberal de incentivo a empresas privadas e privatização das estatais, as IFES sofreram um processo de precarização estrutural e desvalorização docente tão profundo que caía no discurso de privatização da Educação. A reação, consequentemente, também foram as greves em períodos alternados. Ou seja, estamos, ciclicamente nos deparando com o mesmo problema (apesar de os contextos político-econômicos alterarem ou sincretizarem entre neoliberalismo, neodesenvolvimentismo e populismo).
Estes ciclos nos lembram o eterno trabalho vivido pelo personagem Sísifo, um mito grego, que é condenado por Hades a eternamente viver com a tarefa de chegar ao topo de um monte com uma rocha nas costas: sempre quando ele estava a alcançar o topo forças irresistíveis faziam a rocha rolar de volta ao solo. Tudo começava outra vez do solo ao cume.  Era o eterno retorno às dificuldades iniciais. Aparentemente o mesmo se passa entre o Governo e professores (e demais classes de trabalhadores) quando reivindicam a  valorização de suas carreiras.
Quanto mais nos aproximamos do 31 de Agosto mais temos que, necessariamente, atentar para os outros momentos históricos de Greve, atentarmos para o passado, para que a história não se repita. É o momento dos docentes perderem a paciência, tomarem o controle sobre a educação brasileira, radicalizarem o processo de lutas para não entrarem no eterno recomeçar. Se não radicalizarmos e alcançarmos nossas pautas agora, a punição ficará cada vez mais tortuosa, os ciclos de greves virão, outros processos de sucateamento das Universidades virão e continuaremos recomeçando, recomeçando e caindo no esquecimento da história, como se nunca tivéssemos começado qualquer processo de luta. A força que não deixa os professores avançarem, diferentemente da apresentada no mito, não é irresistível por ser facilmente identificada, logo, os professores e a sociedade são os únicos instrumentos que em conjunto podem combatê-la.

Certas pessoas perderão seus cargos e empregos 
O trabalho deixará de ser um meio de vida 
As pessoas poderão fazer coisas de maior pertinência 
Quando os trabalhadores perderem a paciência¹


¹Mauro Iasi – Quando os trabalhadores perderem a paciência

Liziane Pinto Correia é estudante de Direito da UFPB e extensionista do Núcleo de Extensão Popular – Flor de Mandacaru (NEP)

quinta-feira, 16 de agosto de 2012

Somos tod@s Enver José: Voltando à mesa do Juiz


Somos tod@s Enver José: Voltando à mesa do Juiz

Desde o final de dezembro de 2010 ocorreram várias mobilizações populares em todo Brasil contra o aumento abusivo do preço da passagem e a má qualidade dos serviços de transporte coletivo, pressionando nas ruas, os governos e empresários por um modelo justo de mobilidade urbana que atenda às necessidades dos trabalhadores e trabalhadoras brasileiras. A organização e mobilização popular sempre se fizeram necessárias para que qualquer transformação social pudesse ocorrer neste país. Esse é o real papel que os movimentos sociais tem cumprido: reivindicar em todos os espaços públicos, nas ruas e praças, por melhores condições de vida, de trabalho, saúde e educação da população.
O companheiro Enver José Lopes Cabral, militante do Movimento Contra o Aumento JP e, na época, membro do Diretório Central dos Estudantes da UFPB (Gestão ViraMundo), que denunciou as condições precárias de trabalho dos motoristas e cobradores, que questionou a planilha de custos das empresas concessionárias do transporte, que destacou o preço abusivo da tarifa, que lutou ao lado de estudantes secundaristas e universitários, com trabalhadores e trabalhadoras – está sendo acusado de “tentativa de homicídio por arremessar um artefato em um ônibus com efeitos análogos ao engenho de uma dinamite” e por “arremessar uma bola de sinuca” na cabeça de um motorista, podendo pagar injustamente por uma pena entre 3 e 6 anos de reclusão.
As tentativas de frear o movimento foram diversas do fim de 2010 pra cá: criaram entidades fantasmas que apoiavam o aumento da tarifa; compraram sindicatos de motoristas e cobradores para estar contra os estudantes nas ruas; pagaram pessoas fardadas de motoristas para baterem nos estudantes; não atenderam algumas reivindicações e tomaram outras por aceitas para depois não executá-las, etc. Agora, tentam criminalizar o movimento, acusam de criminoso a liderança estudantil, Enver José, que fez parte do Conselho Municipal de Transportes e Trânsito (CMTT) e teve sua participação diluída diante do interesse empresarial de aumentar a tarifa de ônibus.    
Usar o Direito como meio de repressão e freio aos Movimentos Sociais Populares não é incomum no modelo de sociedade que estamos. O uso da técnica legalista e dos aparelhos institucionais de poder e repressão servem a quem está dominando a situação, ou seja, serve a quem detém o poder econômico, neste caso, serve aos Empresários do Transporte.
 Comprovamos isso localmente, já que, desde o fim de 2010, a população pede uma auditoria ao Ministério Público das empresas que receberam concessão pública municipal para fornecimento de transporte público. Até agora nenhuma providência foi tomada.
  Não é criativa, mas ainda é eficaz, a tentativa de colocar o nome de “criminoso” num defensor popular de direitos para colocá-lo sob os olhares de reprovação da sociedade. É necessário deslegitimar esse jus operandi de perpetuação da dominação pela disseminação de sensos comuns inventados de que os movimentos sociais são baderneiros e nocivos à população. Desconstruir esses discursos que escondem a luta por Direitos, num momento em que estes são transformados em mercadorias, no decorrer “natural” do sistema, não é fácil.  A alternativa a esse modelo de sociedade é a resistência.
A unidade precisa mostrar a força de quem luta contra o crime organizado das instituições. É aquilo que ouvíamos nos protestos pacíficos: “Criminoso é esse aumento, dois e dez é um assalto”! Enquanto tentam minar a discussão política que contorna todo o direito de ir e vir dentro de João Pessoa, colhemos forças para que os Movimentos e as Organizações Populares estejam em alerta contra esta e outras criminalizações.
Em João Pessoa o Movimento Estudantil, junto com outros setores de organização popular, mobilizou @s estudantes da UFPB numa Caminhada em Solidariedade a Enver Cabral e Contra a Criminalização dos Movimentos Sociais no dia 23 de Março, ainda, pelo país foram recolhidas assinaturas de movimentos sociais, organizações, universidades e pessoas que estão indignadas com as acusações levantadas.
As primeiras audiências aconteceram dias 26 e 27 de Março deste ano, com suas continuações remarcadas para 11 de Julho e 21 de Agosto, respectivamente. Nesta próxima terça-feira Enver volta à mesa do Juiz para responder um processo calunioso. Empresários, não temos medo. Não é por isso que estudantes secundaristas de João Pessoa deixarão de lutar pelo Passe Livre estudantil, que estudantes deixarão de lutar contra a máfia das carteirinhas de João Pessoa e que a sociedade deixará de combater os aumentos abusivos da passagem!

Contra a criminalização do Movimento Estudantil:
Somos tod@s Enver José!



Lizi Correia - Núcleo de Extensão Popular Flor de Mandacaru

terça-feira, 10 de abril de 2012

Elizabeth, as cores dos trabalhadores quebrarão o seu cinza





Elizabeth, as cores dos trabalhadores quebrarão o seu cinza

Feijão, macaxeira, batata-doce, mamão, banana, graviola, limão, manga, mangaba, jaca, maracujá, côco, sapoti, homens e mulheres trabalhando.Trabalho, terra e moradia. Estas cores são produzidas diariamente pelas famílias do Assentamento João Gomes, da grande Mucatu (que ocupa partes de Alhandra, Conde e Pitimbu), uma das primeiras áreas desapropriadas para a Reforma Agrária na Paraíba – foi na década de 70. São estas famílias que estão resistindo à empresa de cimento Elizabeth. 
E pelo quê resistem? Ora, antes as sementes, os trabalhadores! Eles também fincaram suas raízes naquela terra, são três gerações de agricultores - avôs, filhos e netos – que nasceram, cresceram e brotaram tal quais as hortaliças e frutas colhidas por eles. Não se trata apenas de uma propriedade.
A variedade de frutas e hortaliças produzidas são escoadas para as feiras agroecológicas e para o Ceasa em João Pessoa, e eles também abastecem Recife, Natal e Fortaleza. A área que a empresa reivindica é de 2.400 hectares o que compromete boa parte da produção, da venda, da subsistência e da moradia de mais de 100 famílias, o trabalho de cerca de 10.000 pessoas. Sem contar que nesta região há a maior reserva de águas doces da região Nordeste, a instalação dá fábrica de cimento também comprometeria a fonte natural. Outro fato importante é que alguns dos loteamentos visados integram parte de terras indígenas que estão em luta pelo processo de demarcação, com isso, os índios Tabajaras, também, estão inseridos no conflito.
A Elizabeth conseguiu comprar lotes de terras da região de Mucatu, os quais a venda é proibida. As terras para a reforma agrária não podem ser comercializadas, mas, mesmo assim, ela conseguiu comprar alguns lotes, e, em pouco tempo, conseguiu decisões judiciais para despejar os trabalhadores. Os despejos foram violentos, segundo os relatos dos moradores e da imprensa, com a presença de policiais militares e milícias privadas que vigiam a ocupação. Uma sensação de medo e insegurança ronda essa região, os moradores, desprotegidos, temem outras ações mais violentas.
O MPF já pediu a reintegração de posse à Justiça Federal. Enquanto esperamos os processos correrem judicialmente, visualizamos o quanto este caso vem sendo invisibilizado. Apesar do esforço dos parceiros que estão em defesa dos agricultores em tornar o caso conhecido, as mídias em geral não deram a devida importância, logo, ele não tomou tamanha repercussão dentro da capital paraibana nem em outros locais. 
O fato é que são muitas pessoas correndo o perigo de perder tudo o que conquistaram. É como se o único lugar da região (Conde, Alhandra e Pitimbu), que a empresa podia comprar lotes de terras para sua instalação, fosse justamente a que ela pudesse destruir de mais formas. Será que não existia nenhum estudo de região que indicasse esses fatores? Seria falta de técnicos comprometidos, falta de compromisso com a sociedade e com o meio ambiente, meta desenfreada por lucros?
O concreto, e positivo, nesta situação, é que os agricultores e os índios estão organizados em defesa dos seus direitos à terra e ao trabalho, não estão esperando de braços cruzados que outros decidam sobre o que é deles, construído e vivido por eles. Um espectro de esperança e vitória já ronda aquela região. E ele tem as cores dos homens e mulheres que pisam em chão fértil, de terra, de luta, de fruta. E que farão de tudo para não permitir a vinda da fria, da ambiciosa, da cega, Elizabeth.

Liziane Correia 

quarta-feira, 14 de março de 2012

Nem ir nem vir: a ameaça ao movimento


Nem ir nem vir: a ameaça ao movimento


É o que está dado e num duplo sentido. O primeiro, já sentido por muitos, é o financeiro: aumentos anuais da tarifa do transporte público. É a primeira ameaça. É que este público está do outro lado da catraca.
Para ser público do transporte tem que ter dinheiro. E não é pouco dinheiro, podem fazer as contas. E quanto mais caro o serviço, menos acesso a população tem ao trabalho, à escola e aos espaços de lazer, enfrentando, também, a demora dos ônibus, as superlotações, os engarrafamentos etc. etc. Afinal, direito de ir e vir podem alegar que todos nós temos. Mas, na realidade dura, só vai e vem quem tem dinheiro. Isto quer dizer que o que era pra ser direito virou um serviço, pelo qual pagamos caro. Um serviço mal prestado e muito mal fiscalizado.
O segundo sentido que nos ameaça aconteceu quando os usuários das linhas de ônibus decidiram lutar por seu verdadeiro direito de ir e vir, através do chamado Movimento Contra o Aumento JP. Lembram-se das manifestações populares agitadas que aconteceram pelo Brasil, dos movimentos contra o aumento das passagens de ônibus, das populações das cidades que entenderam que estavam sendo roubados por pouquíssimos empresários que controlam as redes de transporte do país? Pois é, em João Pessoa aconteceu tudo bem diferente. Mais especificamente, me refiro a 2010, ocasião em que os estudantes da UFPB se organizaram para protestar contra o aumento das passagens. Eram caminhadas pacíficas nas ruas do centro, fechamento de apenas uma faixa nas vias duplas, cartazes, panfletagem e constante diálogo com a população, uma espécie de conscientização sobre direitos.
Neste mesmo ano, os Empresários do Transporte de Ônibus Coletivo, numa tentativa de frear o Movimento Contra o Aumento JP, processaram uma das lideranças populares (que era estudante de Geografia da UFPB e hoje mestrando) Enver Cabral. Ele foi o principal contato das mídias para falar de alguns tópicos imprescindivelmente esclarecedores à população em 2010. Ele conseguiu, por exemplo, estudar porcentagens que provam que a tarifa do transporte público de João Pessoa deveria ser bem menor.
No final de Março, este estudante, defensor do direito humano à mobilidade, responderá injustamente a dois Processos Criminais, o acusam de manejar explosivos contra a população usuária do transporte público e de ter lesionado um trabalhador, motorista de ônibus. A mensagem que receptamos é simples: Ou nos pagam ou não se movimentam. Ou se calam ou são presos.
O público das empresas de ônibus é constantemente ameaçado. É vítima aquele e aquela que usa o transporte coletivo de ônibus de João Pessoa, que paga por um direito básico de movimentar-se dentro de sua cidade, com um alto custo em detrimento de outras despesas essenciais, como alimentação, vestuários e medicamentos. É vítima o Movimento que organiza essa população para lutar por seus direitos.
O que vamos fazer?



Liziane Correia - Estudante Universitária e Usuária do serviço de Transporte de Ônibus Coletivo

terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Bairro São José: com santo não se brinca!


Quem sabe o que levou os moradores do bairro São José a se organizarem e ocuparem as duas vias da BR que dão acesso ao Manaíra Shopping? Infelizmente, quase ninguém. Algumas horas atrapalhando o trânsito não deram a visibilidade esperada ao caso do bairro São José. Pois é, os 13.000 trabalhadores que lá habitam, desde a década de 70, estarão assistindo às suas casas serem destruídas revitalizadas em breve.

Alguém pode dizer que uma reurbanização só traz benefícios para a comunidade, afinal, é uma injeçãozinha de dinheiro público que não faz mal. Ainda mais quando o assunto é moradia e saneamento (humano) básico. Querem revitalizar o rio Jaguaribe, é que a comunidade se formou desordenadamente em volta desta área de preservação permanente, e, por isso, algumas famílias são vítimas das enchentes. Bom! Uma coisa boa. Outra: querem dar área de lazer e espaços de convívio para a comunidade – muito bom!

Esta revitalização é custeada pelo PAC-2, especificamente, por um projeto conhecido por ZEIS (Zonas Especiais de Interesses Sociais). Por ser um projeto para a população de baixa renda, que ocupa certas áreas (favelas, loteamentos, comunidades periféricas, etc.) e que cria planos habitacionais que também contemplam espaços de cultura e lazer, o interesse deveria ser, obviamente, de todos e apoiado por todos. No entanto, projetos no papel, verticalizados, não contemplam as minúcias que caracterizam as comunidades e acabam prejudicando a organicidade e modo de vida delas.

No caso do bairro São José, o maior problema é querer comprimir, em média, 13.000 pessoas em 2.961 unidades habitacionais. Pelas contas, são 5 pessoas por enlatado, ou melhor, 5 pessoas convivendo em 42m². E aí entram (cabem ?!) as minúcias. Como ficam as pessoas que tem horta? Que tem animais de grande porte (cavalos, burros, etc)? Que tem casas de 105m² ou maiores? Que gastaram durante a vida, o dinheiro do seu trabalho e do trabalho de seus pais para reformarem e conservarem o seu lar?

O São José, padroeiro dos trabalhadores e trabalhadoras, pode estar se perguntando se não existe algum projeto de reurbanização mais humano, que não deixe na mão os que estão passando necessidades no bairro e nem deixe sem sua morada os que já vivem confortavelmente. E como o santo não é besta (e muito menos o morador do bairro São José), deve estar questionando os valores de contrapartida, aqueles que chegam com a implantação das ZEIS. Vamos tomar nota de que há um shopping Center numa área de preservação permanente – e que, vale ressaltar, não será removido -, há bairros nobres vizinhos (como Manaíra, Tambaú, João Agripino) que criminalizam a pobreza, e há a famosa especulação imobiliária em toda essa redondeza.

Então, as Zonas já são especiais ou serão especiais? E para quem? A sociedade tem mesmo que se acostumar com essas políticas de enlatados para os pobres?  Política já permanente, na realidade, já que temos os ônibus lotados, as salas de aula lotadas, os presídios (super)lotados, e agora, os condomínios habitacionais lotados. Isso parece política social pra sardinha, não é mesmo?! 


Num país de: muitas terras e muitos sem terra, muitos desempregados e uma das maiores economias do mundo, um dos maiores educadores (Paulo Freire) e muitos analfabetos, etc., enfim, tão contraditório, só podemos enxergar uma saída e que é a de incentivar as lutas dos trabalhadores e trabalhadoras que são vítimas da exclusão social.

Liziane Correia é estudante de Direito da UFPB e do Núcleo de Extensão Popular Flor de Mandacaru