terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Bairro São José: com santo não se brinca!


Quem sabe o que levou os moradores do bairro São José a se organizarem e ocuparem as duas vias da BR que dão acesso ao Manaíra Shopping? Infelizmente, quase ninguém. Algumas horas atrapalhando o trânsito não deram a visibilidade esperada ao caso do bairro São José. Pois é, os 13.000 trabalhadores que lá habitam, desde a década de 70, estarão assistindo às suas casas serem destruídas revitalizadas em breve.

Alguém pode dizer que uma reurbanização só traz benefícios para a comunidade, afinal, é uma injeçãozinha de dinheiro público que não faz mal. Ainda mais quando o assunto é moradia e saneamento (humano) básico. Querem revitalizar o rio Jaguaribe, é que a comunidade se formou desordenadamente em volta desta área de preservação permanente, e, por isso, algumas famílias são vítimas das enchentes. Bom! Uma coisa boa. Outra: querem dar área de lazer e espaços de convívio para a comunidade – muito bom!

Esta revitalização é custeada pelo PAC-2, especificamente, por um projeto conhecido por ZEIS (Zonas Especiais de Interesses Sociais). Por ser um projeto para a população de baixa renda, que ocupa certas áreas (favelas, loteamentos, comunidades periféricas, etc.) e que cria planos habitacionais que também contemplam espaços de cultura e lazer, o interesse deveria ser, obviamente, de todos e apoiado por todos. No entanto, projetos no papel, verticalizados, não contemplam as minúcias que caracterizam as comunidades e acabam prejudicando a organicidade e modo de vida delas.

No caso do bairro São José, o maior problema é querer comprimir, em média, 13.000 pessoas em 2.961 unidades habitacionais. Pelas contas, são 5 pessoas por enlatado, ou melhor, 5 pessoas convivendo em 42m². E aí entram (cabem ?!) as minúcias. Como ficam as pessoas que tem horta? Que tem animais de grande porte (cavalos, burros, etc)? Que tem casas de 105m² ou maiores? Que gastaram durante a vida, o dinheiro do seu trabalho e do trabalho de seus pais para reformarem e conservarem o seu lar?

O São José, padroeiro dos trabalhadores e trabalhadoras, pode estar se perguntando se não existe algum projeto de reurbanização mais humano, que não deixe na mão os que estão passando necessidades no bairro e nem deixe sem sua morada os que já vivem confortavelmente. E como o santo não é besta (e muito menos o morador do bairro São José), deve estar questionando os valores de contrapartida, aqueles que chegam com a implantação das ZEIS. Vamos tomar nota de que há um shopping Center numa área de preservação permanente – e que, vale ressaltar, não será removido -, há bairros nobres vizinhos (como Manaíra, Tambaú, João Agripino) que criminalizam a pobreza, e há a famosa especulação imobiliária em toda essa redondeza.

Então, as Zonas já são especiais ou serão especiais? E para quem? A sociedade tem mesmo que se acostumar com essas políticas de enlatados para os pobres?  Política já permanente, na realidade, já que temos os ônibus lotados, as salas de aula lotadas, os presídios (super)lotados, e agora, os condomínios habitacionais lotados. Isso parece política social pra sardinha, não é mesmo?! 


Num país de: muitas terras e muitos sem terra, muitos desempregados e uma das maiores economias do mundo, um dos maiores educadores (Paulo Freire) e muitos analfabetos, etc., enfim, tão contraditório, só podemos enxergar uma saída e que é a de incentivar as lutas dos trabalhadores e trabalhadoras que são vítimas da exclusão social.

Liziane Correia é estudante de Direito da UFPB e do Núcleo de Extensão Popular Flor de Mandacaru

2 comentários:

  1. é raro um aluno de direito da ufpb escrever assim...normalmente tão ligados só nas calouradas...bom q temos exemplos assim

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  2. Infelizmente a tendência é essa mesmo. A de verticalizar as habitações para que caibam muitas em poucos espaço (o que não é ruim, se for prevista infraestrutura para tal ação). Mas o fato de verticalizar não é o mesmo que reduzir o espaço interno. Ninguém vive bem com 42m². Apesar de termos até apartamentos de luxo com um pouco menos que isso (nem tanto, mas até menos que o dobro - 65m² - já encontramos). Isso é culpa de um mercado imobiliário sujo, que consegue comandar qualquer setor/casta da cidade. Hipervaloriza-se o pedaço de terra e o poder público não faz nada para detê-lo. Quem acaba pagando, e muito caro, é o trabalho pobre, que muitas vezes se vê obrigado a deixar tal lugar por não conseguir mais adequar o salário aos gastos.

    Fora essa questão, você tocou num ponto importante. O projeto de reurbanização não prevê ressarcimento as famílias que possuem hortas ou animais de grande porte. Não dá apenas pra dizer que é uma pensa que isso não tenha acontecido. É preciso criticar tal ação. Uma falha grande.

    Enfim é um assunto muito longo, com vários outros pontos que mereciam ser mais debatidos, mas me entrego ao cansaço de agora e espero um dia voltar aqui para comentar mais sobre ele. É bem como você disse. Existem pontos que são mesmo favoráveis e outros que mereciam a atenção e um debate mais prolongado.

    Até mais :D

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