Nas festas de fim de ano compartilhamos com os nossos familiares e companheiros as alegrias conquistadas e as dificuldades que queremos superar, reforçando a união e renovando a esperança por mais conquistas para o ano que está chegando. É o tempo em que estamos munidos de um sentimento geral de comunhão e de renovação da esperança que, misticamente, adentra todos os espaços.
É o período que utilizamos para pensarmos em nós, em nossos próximos e nos outros. No Natal é comum doarmos aqueles pertences que não nos servem mais para os necessitados, os presenteamos com pertences que não teriam a chance de comprar nesta época, em que se confraterniza trocando produtos. É uma maneira simbólica de sermos solidários e fraternos com o irmão mais necessitado, de demonstrarmos que não esquecemos aqueles que não podem ter uma ceia farta.
É, também, um período para fazermos compras (roupas, sapatos, presentes, brinquedos). Bom, se o fim de ano é considerado o tempo da renovação espiritual, está a cada ano se transformando, mais e apenas, na renovação material. Mas não vamos apenas nos culpar, o problema é que a alma do negócio costuma aparecer com mais intensidade durante o Natal e o Ano Novo - ela está nas decorações, nos panfletos, nos outdoors, nas lojas, na televisão, enfim, está em tudo. E não acaba aí, ela também tem a pretensão de estar em todos nós, é ela que faz nascer em nós uma necessidade de nos livrarmos das coisas antigas, comprarmos coisas novas e presentearmos a todos que queremos bem. Ou seja, é nesta época que ela diz mais forte o que vestiremos, beberemos, comeremos e como presentearemos os nossos próximos e não tão próximos – porém, necessitados.
Para a luta por Direitos Humanos, temos que estender a mística de sentimentos de renovação da esperança e da comunhão para todos os dias do ano. Se é a fraternidade e a solidariedade que buscamos, para que o nosso irmão passe o ano bem, temos um presente para construir com ele - todos os dias - e não podemos cair apenas nas tentações da compra de presentes que a alma do negócio nos oferece. O presente alternativo é simples: um mundo justo e igual. E, para que o construamos, temos que nos doar aos outros, lutar com os outros, nos doar de presente, estando presentes nas lutas por Direitos Humanos.
Neste Natal e neste Ano Novo vamos não só renovar nossa esperança, mas vamos semeá-la. Vamos prometer participar das lutas por Direitos Humanos. Vamos prometer compartilhar do sofrimento daqueles e daquelas que estão sem-teto (30 milhões no Brasil), das famílias que estão sem-terra (1% dos proprietários detêm 46% da terra do Brasil), das pessoas que estão passando fome (mais de um bilhão no mundo), dos trabalhadores que estão desempregados (1,6 milhões no Brasil). Vamos construir as igualdades, para que, durante o ano todo, não sejam violentadas as mulheres (a PB está no 4º lugar nacional em violência contra a mulher), não sejam assassinados os negros (na PB o risco de violência contra os negros é 1.189% maior e, no Brasil, 65,5% dos assassinados são negros), não sejam assassinados os homossexuais (a PB ocupa o primeiro lugar no ranking nacional de crimes homofóbicos).
Se é a alma do negócio que nos faz esquecer os problemas que temos em comum, - se é ela que nos faz ir a chás de caridade1 em detrimento da luta pela mudança das condições materiais da vida de boa parte da humanidade e se é ela que nos separa da vida dos esfarrapados e miseráveis – vamos planejar para o próximo ano capturá-la e aprisioná-la numa caixinha de presentes, vamos controlá-la e forçá-la a dizer apenas o que nós, homens e mulheres, quisermos nos fins de ano! No ano inteiro! Esse negócio que engana não tem alma¹, nós e os Direitos Humanos temos várias.
Aos esfarrapados do mundo e ao que neles se descobrem e, assim, descobrindo-se, com eles sofrem, mas, sobretudo, com eles lutam.³
¹ Manoel de Barros, A máquina.
² Nação Zumbi, Propaganda.
³ Paulo Freire
Liziane Correia, estudante de Direito da UFPB e
extensionista do Núcleo de Extensão Popular – Flor de Mandacaru (NEP)
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