quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

O custo de ir e vir: o movimento contra o aumento da passagem


De quem é o benefício? Não precisa pensar muito pra dizer que a cidade tem condições de suportar um transporte público de baixo custo ou gratuito – quem lembra do SETUSA? A concessão da prefeitura aos empresários do transporte é um grande desrespeito aos direitos do cidadão pessoense, que é enganado enquanto o serviço é vendido como benefício.
Vamos pesar o custo real dos transportes para um cidadão, considerando que seja morador de uma zona periférica, através da imagem de um dia de trabalho. Primeiro, há poucas linhas do ônibus em circulação, as vias urbanas são péssimas, junte o trânsito, o ônibus chega lotado, demorou a passar, você não tem direito nem a sentar, essa linha não vai até o outro lado da cidade, pegue outro ônibus: tudo de novo. Depois de quase duas horas de estresse, chega-se ao emprego. São mais oito horas. No fim do expediente: tudo se repete. Custo: quatro passagens gastas, doze horas fora de casa.
O custo não pesa só no bolso: além do financeiro, tem o psicológico. No primeiro, uma considerável parte do seu salário serve para alimentar os lucros do empresário dos transportes. Sem contar o quanto o patrão, também empresário, lucra enquanto explora o seu serviço. Depois de doze horas fora de casa, o estresse causado pela falta de tempo (para o descanso, para o lazer, para o estudo e os afazeres do lar) torna a vida mais difícil.
Fica claro que o benefício vai para os empresários. Tanto do transporte quanto para os demais. Afinal, muita gente sai de casa na condição de trabalhador ou de consumidor. Enquanto isso, a maior parte da população pessoense fica sem acesso à própria cidade. Sem acesso à saúde, ao trabalho, ao estudo e ao lazer. Ficam à mercê do Estado, que entrega os direitos básicos da população aos setores privados. Essa é a injustiça que a política da capital paraibana tenta mascarar através de praças, campos de futebol, shows gratuitos e serviços de internete.
A cadeira esborrachada do DCE. O Movimento Estudantil de João Pessoal, através do Diretório Central dos Estudantes da Universidade Federal da Paraíba, se propôs a pensar com a população o real valor do transporte coletivo. É prática dos empresários aumentarem a tarifa durante as festividades de fim de ano, sempre entre o natal e o ano novo, com a homologação da prefeitura.
No fim de 2010, o Conselho Municipal de Transportes e Trânsito (CMTT) – instância consultiva da STTrans, se reuniu para discutir as propostas para o novo aumento. O DCE que possui legalmente assento no conselho foi excluído desse debate, mesmo anteriormente tendo exigido ao CMTT que a discussão fosse realizada apenas quando o período se iniciasse, para que os estudantes, parcela significativa dos prejudicados com o aumento pudesse participar das discussões. A tarifa subiu de R$ 1,90 para R$ 2,10, um aumento de 10,5%.
A homologação realizada pelo Prefeito Luciano Agra (PSB) com o CMTT passou por cima da Lei 8.767, de 15 de abril de 2009, não foram realizadas audiências públicas com setores representativos mais atingidos da sociedade - trabalhadores, estudantes e moradores de comunidades periféricas - para discutir os aumentos das passagens de ônibus.
Dizem os número irreais. A disputa pela opinião pública é ridícula. Querem que o povo acredite que vale a pena pagar por um transporte que se renova constantemente e pela qualidade. O argumento é bem afastado da realidade, mesmo assim, é usado. Alem disso, tentam convencer a população através de planilhas e dados, números sem fim, que o aumento é justo. Longe de ser uma questão de gráficos orçamentários da empresa, ou jurídica, a questão é política. São os direitos de uma boa parcela da sociedade que estão sendo tomados.
Durante a primeira manifestação dos estudantes (29/12/2010), foi exigida uma audiência com o Prefeito para o dia seguinte, que alegou que não poderia comparecer indicando para a reunião a superintendente da STTrans Laura Farias. No dia seguinte, a mesma se reuniu com três representantes do DCE. A negociação não iniciava, a superintendente não tinha pretensão de dialogar com os estudantes, a conversa não avançava na medida em que ela não ouvia os argumentos contrários ao aumento enquanto cuspia números, dados e porcentagens a serviço dos empresários.
O lucro dos empresários é de quase metade de cada passagem, as planilhas e relatórios escondem esses dados, os números são irreais, as contas são desonestas. Enver José, o conselheiro tarifário do DCE, disse que a planilha tarifária determina que quanto maior for o número de estudantes, mais alto é o preço da tarifa. O fato é que de 2006 até o ano passado, a quantidade de estudantes diminuiu de 40% para 20%, por conta da bilhetagem eletrônica.
O descontentamento dos estudantes que aguardavam na chuva os lembrou que a Prefeitura é do povo, então, resolveram entrar. Os portões logo foram trancados. Entraram pelos portões dos fundos, os guardas tentaram impedir a entrada pacífica dos estudantes e alguns funcionários diziam que não podiam ficar ali, vozes gritavam que a prefeitura era do povo. Tentaram expulsar os estudantes e ameaçaram parar a reunião que não avançava. Permaneceram firmes, resistindo até a reunião acabar. O resultado? Previsível. A reunião não deu em nada.
Ignorando o povo e parando a cidade. A passagem passou a custar R$2,10 a partir do dia 3 de Janeiro deste ano. A luta dos estudantes não parou. E o grito passou a ser: se a passagem não baixar a cidade vai parar! Desde o aumento os estudantes realizaram cinco atos no centro de João Pessoa. As concentrações sempre aconteceram em frente à Prefeitura e a paralisação do trânsito nos cruzamentos entre ela e a Lagoa. Foram faixas, cartazes, apitos, caminhadas na rua, ocupação gratuita na Integração de ônibus e panfletagens, tudo isso para que o prefeito do Partido Socialista Brasileiro escutasse a sociedade.
A repressão também apareceu. Na tarde do dia 12/01, cerca de 200 homens fardados de motoristas e cobradores, entre eles capangas e agitadores, receberam dos empresários do transporte R$ 30,00 para que reprimissem o ato dos estudantes. Ironicamente, diferente das outras manifestações, não havia viaturas da polícia próximas. A polícia foi chamada e garantiu aos estudantes que poderiam sair em caminhada, direito seu, pois, nada aconteceria e que já haviam acertado que os motoristas já estavam de saída. A caminhada mal havia começado quando motoristas e pessoas armadas avançaram para cima dos estudantes, a polícia que estava acompanhando o ato em sua viatura não fez nada. O choque chegou atirando para cima, dando coronhada em estudante e jogando gás de pimenta. Ficou mais uma vez claro a quem os aparelhos do Estado obedecem, eles e os motoristas tem o mesmo patrão. 
O Prefeito marcou uma audiência para terça-feira, dia 18, não compareceu. Agora os estudantes se organizam para um ato maior na próxima quarta-feira (26) e esperam que Luciano Agra apareça e se posicione. A força do movimento contra o aumento cresce a cada ato, mesmo nas férias, e a mobilização será muito maior quando os estudantes voltarem às aulas em fevereiro.
 Enquanto isso o movimento continuará parando a cidade e exigindo a redução da tarifa para R$1,90; pedindo atuação do Ministério Público, uma auditoria para analisar as contas das empresas de transporte público e as planilhas que justificaram o aumento; debates e seminários sobre mobilidade urbana em João Pessoa; e a criação de tarifas sociais.
Os pessoenses tem sua dignidade humana diminuída sempre que seu direito de ir e vir - pressuposto de liberdade, é diminuído. A manutenção desses aumentos faz piorar a condição de vida das pessoas. Enquanto o objetivo for o lucro dos empresários e não a qualidade de vida do povo, mais a cidade vai sofrer. Esse desgaste, que é maior nas classes populares, reflete nas outras políticas e tentativas de serviço público da cidade, como escola, hospital, cultura, etc. É a via para chegar nos demais direitos que está mal sinalizada. O caminho ainda é a luta do povo pela sua emancipação. É uma construção coletiva. A Prefeitura precisa respeitar a necessidade que o povo tem e visualizar uma nova política urbana, que crie condições coletivas de mobilidade, radical ou não, mas que não crie anualmente injustiças sociais.

#contraoaumentoJP 

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