“Morreu na contra-mão
atrapalhando o tráfego.”
Chico Buarque
A cidade deve ser
planejada de acordo com quem já se movimenta nela, atendendo, pois, as
necessidades de trabalhadores que todos os dias saem de casa para movimentar a
economia local. Trabalhadores das periferias saem todos os dias de casa de
carroça com tração a cavalo, ou com carro de mão improvisado ou de bicicleta. O
dia de trabalho já se inicia com o risco de locomover-se pelas vias até os seus
postos.
Temos um planejamento
urbano que prioriza motocicletas, ônibus e carros, e deixa a cada dia sem saída
– literalmente – pessoas que ainda não possuem condições de participar do
modelo mais “urbanizado” de mobilidade. Quando o Município pensa em
infraestrutura (o que pouco acontece) para o trânsito, limita-se a multiplicar
e calçar vias, aumentar frotas de ônibus, beneficiando uma parcela da
população. Nunca de pensa em alternativas que agreguem todos os meios, como,
por exemplo, a construção de largas ciclovias que liguem o Centro Comercial de
João Pessoa a outras localidades, que possibilitem a passagem de carroças e
cavalos.
A própria construção de
um modelo de mobilidade voltada para carros e ônibus dificulta a visibilidade
desses atores sociais que participam da vida urbana, trabalham e produzem
culturalmente. É como se os carroceiros não existissem em João Pessoa. Ou
aparecem apenas quando causam acidentes no trânsito e quando pensamos no
“velho”, “antigo”, “rural” e “ultrapassado”. É um choque de realidades
inventado. E não passa de uma escolha política de: para quem e por quem a
cidade será movimentada.
Já existem ciclovias em
João Pessoa, mas elas atendem outra necessidade. Não nasceram com o compromisso
de melhorar e/ou desafogar o trânsito, beneficiar trabalhadores das periferias;
ela existe como uma política de bem estar, voltada à classes média e alta que usam
a bicicleta, na maioria das vezes, como passatempo ou momento fitness.
O
questionamento é: qual é e quem é a prioridade quando discutimos a mobilidade urbana
em João Pessoa.
Poder optar por que meio
de transporte usar, passa pela análise da segurança em utilizá-lo, pelo
conforto e pelo preço. Eu, por exemplo, não iria à Universidade de bicicleta por
que teria que atravessar quatro grandes avenidas, sendo que nenhuma delas
possui ciclovia. Caso houvesse, em um mês o consumo que eu faço andando de ônibus
poderia ser reduzido, permitindo que eu investisse o dinheiro economizado no
meu próprio estudo.
Claro que precisamos
pensar a mobilidade através de técnicos da engenharia, no entanto, temos que
ser mais sensíveis e perceber que a escolha técnica nesses casos é ao mesmo
tempo política.
E, atualmente, a
política de mobilidade fere o direito do cidadão à movimentar-se por sua própria
cidade. Na medida que o poder público investe na indústria de carros
individuais, e negocia com empresas de ônibus, ela, claramente, escolhe
beneficiar as empreiteiras e não a população.
Ao discutir a
mobilidade urbana tornam-se invisíveis os carroceiros e cavalos se forem eles
os beneficiados diretos. No entanto, tornam-se visíveis carroceiros e cavalos
quando acontecem acidentes no trânsito e se cogita a proibição legal desses
meios de transporte. Torna-se invisível o poder público para discussão desse
conflito.
Liziane Correia é
estudante de Direito da Universidade Federal da Paraíba e
do Núcleo de Extensão Popular Flor de
Mandacaru
Para o Jornal O Contraponto, 22 de Janeiro de 2013
Para o Jornal O Contraponto, 22 de Janeiro de 2013